quinta-feira, 9 de janeiro de 2020

Resenha: David Bowie - Diamond Dogs (1974)








O último disco da fase "Glam Rock" do camaleão, "Diamond Dogs" é um dos mais curiosos de sua carreira. Já preparando terreno para a fase "soul branco", é possível identificar já uma mudança sonora e estilística do homem que caiu na terra, mas ainda com um pé fincado no Glam que o tornou famoso. Já sem seu fiel escudeiro Mick Ronson, que saiu em carreira solo antes das gravações do disco (na verdade, a história é um pouco mais complexa que isso), Bowie conseguiu finalizar um período de glamour com um disco vibrante, inteligente e com diversas texturas que vão do rock básico á momentos mais introspectivos. 




As Gravações



Mick Ronson ajudou David a orquestrar algumas das músicas e participou de alguns ensaios antes da banda entrar em estúdio. Por incrível que pareça, ao invés de recrutar outro guitarrista solo (Mick era um gênio das seis cordas), Bowie decidiu tocar as guitarras ele mesmo!.
Então aqui ouve-se  um timbre mais sujo, minimalista e rudimentar, mas que consegue soar totalmente conectado com o que o disco propõe. Vale também ressaltar que  em "1984", quem tocou foi o guitarrista Alan Parker. Ansley Dunbar, lendário baterista, participa das gravações assim como o experiente baixista Herbie Flowers (T.Rex, Elton John),  e outros músicos de estúdio.

Uma experiência importante é que Bowie aqui se reunira com o lendário Tony Visconti, que ajudou a mixar o álbum e trabalhou em alguns arranjos de cordas, lembrando que Visconti  antes produziu os discos "David Bowie" de 1969 e o fantástico "The Man Who Sold The World" de 1970. Depois, trabalharia com o Starman pelo resto da década, inclusive no período importantíssimo de Berlim.

Durante as gravações o popstar já apresentava problemas de comportamento devido ao seu vício em cocaína, que começou a agravar na época. Por anos Bowie disse que essa época foi uma das mais doidas de toda sua carreira. A intenção dele era de lançar um disco conceitual chamado "1984", inspirado no clássico livro de George Orwell, mas não conseguiu os direitos, o que acabou obrigando Bowie a buscar outra proposta. Mesmo assim, o Lado B de Diamond Dogs é totalmente inspirado na obra.

Já o lado A, também segue uma linha conceitual concentrada na história de um personagem chamado "Halloween Jack", que vivia no topo de um arranha-céu em uma Manhattan pós-apocalíptica, ou melhor "Hunger City" (cidade da fome).


O Álbum 

Sem dúvida, "Diamond Dogs" ainda possui respingos evidentes do alter ego de Bowie, Ziggy Stardust, musicalmente e também estilisticamente, vide o visual dele na capa.  Capa curiosa que teve sua primeira prensagem censurada, pois o famoso "cachorro-bowie" deitado deixava a mostra seu "bingulim"( um absurdo pra época) e foi substituída por uma versão "clean".

Promo do álbum. 1974. 






Então vamos as músicas:

Future Legend/Diamond Dogs -  "Future Legend" é uma intro narrada por Bowie, que ao entrar em "Diamond Dogs" vem com a clássica frase..."This ain't Rock N' Roll...This is GenoCIIIDE...". Dá até arrepio. Pra mim umas das melhores músicas da carreira de Bowie. Rock N'Roll simples, nos moldes Glam, com uma pitada de Rolling Stones, uma batida sexy e a guitarra suja de Bowie, que dá o tom. Clássico. 10/10.

Sweet Thing/Candidate/Sweet Thing (reprise) -  Encaro essas três partes como uma suite. O início com "Sweet Thing" é uma balada melancólica com Bowie cantando com um timbre super grave, ouçam com atenção como os primeiros versos soam exatamente como Andrew Eldritch  em seu Sisters Of Mercy uma década depois. Mas de repente, David  brinca com tons mais altos e médios, uma performance genial que comprova o quão ele era um excelente cantor.

"Candidate" inicia com um solo de sax e uma fanfarra de caixa, Bowie soa como um  crooner e a música vai crescendo até tomar um ritmo glam típico dessa fase, repetindo o refrão com mais entusiasmo. Já a reprise de "Sweet Thing" tem também destaque para o Sax (tocado por Bowie, vale ressaltar) e mantém o clima baladístico que e evolui para um belo groove de baixo e batera que vai ficando mais rápido enquanto nosso herói tira um feedback da guitarra. Coisa linda. 10/10.

Rebel Rebel - Acho que até o fã mais casual de Bowie já ouviu essa música várias vezes. É um clássico e o maior hit do disco (Como single, "Diamond Dogs", a música, foi um fracasso), alcançando o 5ºlugar da parada britânica e o 16º da parada americana. Possui um riff memorável e uma batida glam segura de Ansley Dunbar. Foi a única música do disco que foi tocada em todas tours do camaleão. 9.5/10

Rock N' Roll With Me - Supostamente escrita para um provável musical sobre Ziggy Stardust, "Rock N' Roll With Me" poderia estar em qualquer um dos discos anteriores. Uma semi-balada guiada pelo piano, com um belo refrão e um  vocal mais estridente de Bowie. Gosto muito dela, apesar de bem previsível. Com um solo de Mick Ronson aqui, ganharia nota 10. 8.5/10

"We Are The Dead" - Aqui começamos a parte "1984" do disco. Uma beleza teatral bem dinâmica, é uma música pomposa, cuja letra vem de um trecho do livro de Orwell. Claramente é sobre os dois personagens principais da obra. Bela canção. 9.5/10

"1984" - Funky, bem funky, aqui declara-se o que  Bowie faria ano seguinte em "Young Americans", deixando o trash-glam de lado totalmente. O groove de batera do Tony Newman é um sacolejo sem precedentes. A letra é uma alusão ao interrogatório de Winston Smith no romance de mesmo nome. Saiu como single também. 10/10

Big Brother/Chant Of The Ever Circling Skeletal Family  -  Aqui o personagem acaba passando por uma lavagem cerebral e se rende ao Big Brother. Musicalmente, temos belos corais e uma condução acústica leve no início e um refrão quase Hard Rock. Já "Chant of..." Encerra o disco com um coro em falsete em um riff glam que se repete por diversas vezes até entrar em um repeat constante a primeira silaba de "Brother"..(Brr brrr brr) por mais de um minuto. Final épico. 10/10




                                                     
                   




















Recepção/Tour 






"Diamond Dogs" chegou ao topo das paradas britânicas e canadenses e quinto lugar nas paradas americanas. A revista Sounds considerou o disco "O trabalho mais impressionante de Bowie", e uma tour de proporção megalomaníaca viria a seguir. Bowie e seus empresários da Mainman, gastaram no que seria hoje o equivalente a 1 milhão de dólares no set de palco e toda sua estrutura e foram necessários mais de dois meses de ensaios. A tour iniciou-se no Canadá, com bastante trabalho de divulgação em TV e rádio.

O palco era basicamente uma cidade (a já mencionada "Hunger City") com uma ponte acima da platéia e outras peculiaridades. Muitos dos "props" utilizados no show acabaram falhando, e não ajudava também o fato de Bowie estar sob influência de cocaína e muita birita, como ele descreveria anos depois, "Não sabia o que eu tava fazendo no meio daquela bagunça". Praticamente o disco todo fez parte do repertório, com exceção de "We Are The Dead".

A última perna da turnê foi feita com um palco simples (pra loucura do empresário Tony Defries que investiu rios de dinheiro na estrutura anterior) e com músicas no repertório que fariam parte do disco "Young Americans.  A tour então foi rebatizada de "The Soul Tour", já mostrando qual era a praia que o Bowie iria seguir. Vale lembrar também que nessa tour iniciou-se a parceria com o guitarrista Earl Slick, então bem jovem, que tocaria muitas vezes com Bowie.


(Protótipo do palco da tour "Year Of The Diamond Dogs")



(Bowie & Earl Slick) 




(Big Brother)





(Comercial da época) 






Resumindo, "Diamond Dogs" é um disco importante para a transição do Bowie Glam para o Bowie Soul . Um belo adeus ao glitter  e as botas de  plataforma. Sinto que é um disco injustiçado, não acho tão abaixo assim de "Alladin Sane" ou "The Rise And Fall Of Ziggy Stardust And The Spiders From Mars".  Recomendo...

NOTA FINAL : 9.5/10 

















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